terça-feira, 4 de setembro de 2012

A importância da Presidência [OPINIÃO]

Por Emerson Gonçalves |


O pênalti é tão importante que tem que ser batido pelo presidente do clube. Assim falava Neném Prancha, o filósofo da bola. Vou reler essa sua máxima:

O clube é tão importante que só pode ser presidido pelo presidente que só se dedica a ele.
Presidência é função de período integral. Se não tomar cuidado, 24 horas por dia, 365 (ou 366) dias por ano. Não dá para dividir a presidência com o escritório, com a fábrica, com a repartição, com o consultório, com a Câmara Municipal ou o que quer que seja.

A presidência é tão importante que seu ocupante tem que ser remunerado por isso.

Presidência de um clube não é tarefa para diletantes, para torcedores, para apaixonados. É uma função de fundamental importância econômica, administrativa, política, cultural e social e outras mais, que exige de seu ocupante conhecimento, habilidades diversas, principalmente no relacionamento e liderança de pessoas, experiência, sangue frio, capacidade de tomar decisões e a fundamental habilidade, e mais que isso filosofia de vida, de trabalhar em equipe e ser um democrata teórico e prático.

Hoje, um clube de ponta é tão grande economicamente como muitas empresas, e é muito mais importante nos aspectos culturais e sociais do que qualquer gigantesca multinacional. O presidente de um grande clube, na minha visão, deveria ser recrutado no mercado de altos executivos e com uma condição: não ser torcedor de futebol ou não torcer para o clube que vai presidir. Pois presidentes-torcedores ou torcedores-presidentes, já temos de sobra e os novos tempos pedem novos dirigentes, novas cabeças, novas ideias.

Como já tenho 57, quase 58 primaveras, posso falar com tranquilidade que a presidência de um grande clube não é tarefa para substituir o suposto dolce far niente da aposentadoria, pois ela requer uma energia e uma disposição para o trabalho incessante que massacrariam a vida de um bem sucedido aposentado. Um preço que seria pago até mais pela família do que pelo próprio aposentado apaixonado. E isso acontece direto, acreditem.

Tudo isso, é claro, refere-se ao presidente executivo de um clube. Outras funções, como conselheiro ou presidente de um conselho deliberativo ou de administração, podem e devem, têm mesmo que ser exercidas pelos sócios que se destacaram no clube, que foram eleitos pelos demais associados e sócios-torcedores (sim, sócios-torcedores, pois ninguém tem mais direito a votar e ser votado do que os torcedores que se associam). O envolvimento não tem a mesma carga e intensidadade dos dirigentes executivos e, ao invés de atrapalhar e comprometer a relação com a família e o descanso, são importantes e saudáveis complementos na vida das pessoas apaixonadas por um clube e que resolvem dedicar a ele parte de seu tempo.

E a troco de quê tudo isso? – deve estar se perguntando você, paciente leitor.

A troco da realidade vivida por nossos clubes e que tem hoje, no Clube de Regatas do Flamengo, um exemplo perfeito do que falei acima. Pessoal e politicamente nada tenho contra a vereadora Patrícia Amorim – ou contra a presidente Patrícia Amorim? Bom, nada tenho contra ela em qualquer esfera de sua vida, mas tenho acompanhado sua presidência, da qual, confesso, esperava muito. Por reunir duas características que muito prometiam: ser mulher, geralmente boas e cuidadosas administradoras, e ter sido uma atleta de ponta e sucesso, o que, em tese, ter-lhe-ia dado grande e íntimo conhecimento do mundo esportivo, capacitando-a ainda mais para dirigir um clube do porte e importância do Flamengo.

Embora seu primeiro ano tenha sido marcado por uma tragédia que abalou o mundo do futebol, e um desconto tenha que ser dado por conta disso, o “caso Zico” já deu o bastante para se pensar a respeito do futuro. Ligações do mundo da política partidária e municipal ou estadual ou federal com o mundo da bola não são boas para ninguém. Devem, precisam ser evitadas.

O fato de Patrícia Amorim ser uma política militante e ter sido eleita pelo voto popular para exercer a vereança na cidade do Rio de Janeiro já é o bastante para ocupar 100% da vida e atenção da pessoa eleita. Dividir essa representação com a presidência de um clube de futebol não cabe. Não tem como dar certo. No mínimo uma parte perderá: ou o povo que ela representa ou o clube que preside. Ou, o que é mais comum, mais correto e muito pior, perdem as duas partes. Perdem todos, perde a sociedade e perde o torcedor.

Não bastasse tudo isso, temos agora a revelação em matéria da ESPN Brasil que a vereadora Patrícia Amorim nomeou para cargos diversos no serviço público 25 pessoas ligadas à sua família ou ao Flamengo.

Uma mistura de nepotismo com interesses pessoais numa atividade outra. O próprio presidente do Conselho Fiscal do clube foi funcionário da vereadora. Ao deixar o cargo, colocou seu sócio para sucedê-lo, o que me deixa pensando na antiga colônia e suas capitanias hereditárias. As nomeações foram legais, mas foram despidas de ética, para dizer o mínimo.

Sem querer ser um tolo sonhador, mas talvez sendo, seria ótimo que o mundo do futebol proporcionasse bons exemplos à sociedade nos mais diferentes sentidos, principalmente às suas camadas mais jovens, que têm no futebol um importante fator de identidade, contato com o mundo e com valores diversos. Quando esses valores chegam poluídos, desprezando a ética e os bons princípios de conduta e comportamento na sociedade, fica ainda mais difícil conseguir que esses jovens venham a se tornar bons cidadãos.

Por tudo isso, já está mais do que na hora dos grandes clubes brasileiros encararem a sério sua profissionalização de fato em todos os escalões e não somente no elenco de jogadores.

Fonte: Olhar Crônico Esportivo – Emerson Gonçalves 

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